quinta-feira, 15 de abril de 2010

ADOLESCÊNCiA


As ESPECULAÇÕES comerciais de John Allan em Londres não foram felizes. Voltou para os Estados Unidos, chegando a Richmond, em agosto de 1820, cheio de consideráveis dificuldades, nas quais se viu também envolvido seu sócio Charles Ellis. Cessões de bens de raiz tiveram de ser conseqúentemente feitas para satisfazer os credores. A vida da família Allan, porém, continuou a ser confortável. Edgar foi mandado para uma Academia, dirigida por William Burke e mais tarde por Joseph H. Clarke, e frequentada pelos filhos das melhores famílias de Richmond. Na escola, o jôvem Poe sobressaiu-se em línguas, oratória, representações teatrais e realizou notáveis façanhas em natação.


Parece ter atraído a atenção de seus mestres e dos colegas mais velhos pelo seu brilho e ter sido bastante estimado, apesar de mostrar-se um tanto distante, pela maior parte de seus companheiros. Em idade muito precoce começou a escrever poesias, datando seus versos logo dos treze anos. Em 1823, tornou-se íntimo da casa dum colega de escola, Robert Stanard, cuja mãe, Jane Stith Stanard, tomou terno interesse pelo brilhante rapaz, afeição que foi ardente e romanticamente retribuida. Foi a essa senhora que Poe dedicou mais tarde seu poema "Para Helena", que começa: Helena, tua beleza é para ..... A Sra. Stanard em breve enlouqueceu e morreu.

Essa tragédia atingiu, sem dúvida, profundamente o coração de Poe, tendo sido para ele um grande golpe, que o abalou de modo intenso. Conta-se, não sem discutível autoridade, que ele rondava à noite o seu túmulo, no cemitério solitário. Não há dúvida, porém, de que continuou a estremecer-lhe a lembrança, enquanto viveu.

Seja como for, porém, em 1824, o jovem poeta, que estivera dirigir às moças dum colégio feminino vizinho juvenis versos lírico: achou-se plenamente embarcado nas águas turvas duma vida ma adulta. A Sra. Stanard morrera; seu pai adotivo achava-se em graves apuros financeiros; a saúde da Sra. Allan ia rapidamente definhando e havia na casa uma dissensão doméstica da mais séria espécie: John Allan dava-se, de tempos em tempos, a relações extra maritais. Alguns de seus filhos naturais viviam então em Richmon e, dessa ou daquela forma, chegou isso ao conhecimento de sua mulher, cujo pesar foi imenso.

Durante a visita de Lafayette a Richmond em 1824, o jovem Poe, que era oficial numa companhia d cadetes, esteve na escolta do velho general. Isto lhe deu novo senso de sua própria dignidade e importância, e ao mesmo tempo parece que em alguns de seus encontros na cidade com companheiros adultos veio a saber do modo de vida de seu pai de criação. Em casa Edgar tomou o partido de sua mãe e uma desavença, que, através de várias ramificações, durou por mais de dez anos, se criou entre Poe e John Allan. A situação era caracteristicamente exasperante a todos os respeitos, e o conflito, dramático.

O Sr. Allan, ao que parece, havia, ao tempo da morte da Sra. Davi Poe, entrado na posse de parte da correspondência dela. ( que havia naquelas cartas ninguém jamais saberá, pois foram mais tarde destruidas pela Sra. Clemm, a pedido do próprio Poe. Talvez houvesse algo de comprometedor nelas. Seja como for, a fim de garantir-se o silêncio de Edgar em torno de seus próprios negócio, o Sr. Allan escreveu uma carta a William Henry Leonard Poe, em Baltimore, queixando-se de Edgar em vagos termos, acusando-o de ingratidão e atacando a legitimidade de Rosália, irmã do rapaz. ( O efeito dessa carta, e talvez tenha havido mais de um, foi evidentemente transtornador para ambos os filhos de Isabel Poe. Decerto tornou ainda mais tensas as relações na casa de Allan, em Richmond.

Três anos mais tarde, encontramos Henry, em Baltimore publicando um poema, intitulado "Numa Carteira de Lembranças" que dá todas as mostras de que as dúvidas a respeito da legitimidade de sua irmã tinham atingido o alvo. Por esse tempo começava Rosália Poe a dar sinais de paralisação do desenvolvimento. Jamais se desenvolveu plenamente e, embora continuasse a ser estimada como filha pelos Mackenzies, que haviam desde o começo acolhido, permaneceu, quando muito, com uma triste recordação do passado para seu irmão Edgar.

Sobreviveu-lhe muitos anos, morrendo afinal numa instituição de caridade em Washington, D.C. A morte da Sra. Stanard, os apuros financeiros e consequente irrtabilidade de John Allan, as disputas e contra-ataques em casa, sua própria posição duvidosa ali - pois nunca fora adotado e sua situação de caridade era constantemente reiterada -, tudo isso formava um penoso ambiente para um poeta jovem e ambicios. Acresce que há indicações de que o Sr. Allan, como escocês prático, 21 tinha pouca ou nenhuma simpatia pelas ambições de seu filho de criação no campo da literatura. Em 1825, os apuros financeiros do Sr. Allan foram amplamente aliviados, pela herança de grande fortuna de seu tio William Galt. Viu-se ele, em suma, homem bastante rico. Todo o teor de vida da família mudou então para um método consoante com suas melhores condições. Foi comprada nova casa de considerável aparato, e nessa vasta e confortável mansão, situada nas Ruas Quinta e Principal, da cidade de Richmond, teve início uma série de diversões e funções sociais , a despeito da saúde decadente da dona da casa. Poe acompanhou a família, na nova casa. Seu pai de criação retirou-o da Academia do Sr. Clarke e tinha-o preparado para a Universidade de Virgínia, que, sob o patrocínio de Thomas Jefferson, acabara recentemente de abrir as portas.

Numa rua vizinha, vivia uma mocinha, chamada Sara Elmira Royster. Poe freqúentava-lhe o salão, onde cantavam e desenhavam quadros. Elmira tocava piano, enquanto Edgar a acompanhava na flauta, ou passeavam pelos jardins, de mãos dadas. Sabe-se que Henry Poe visitou seu irmao, em Richmond, por esse tempo e acompanhou Poe à casa dos Roysters. Antes de seguir para a Universidade, Edgar ficou noivo de Elmira. O trato, porém, foi mantido oculto das pessoas de ambas as famílias. Em fevereiro de 1826, Edgar A. Poe matriculou-se na Universidade de Virgínia. Tinha então apenas pouco mais de dezessete anos, mas pode dizer-se que sua idade adulta começara. Sua posição na Universidade era precária. Como 'filho" dum homem rico, possuía bastante crédito e o próprio Poe estava disposto a viver de acordo com tal reputação. Por outro lado, seu pai de criação parece mesmo, naquele tempo, ter- se mostrado tão alheio a seu pupilo que lhe dava mesada muito menor do que a necessária para sua manutenção.

O jovem estudante fez brilhantes progressos nos estudos, mas também se entregou a rapaziadas um tanto fortes. A fim de manter sua posição, começou a jogar intensamente; perdeu, e utilizou-se de seu crédito junto aos lojistas locais de modo atrevido. Foi por esse tempo também que ficamos sabendo, pela primeira vez, ter ele começado a beber. Os efeitos de bem pequena porção de álcool no organismo de Poe foram devastadores. Parece ter sido um jovem brilhante, mas um tanto excêntrico e francamente nervoso.

Outra causa de tensão, nessa época, foi o infe- nota de ledora- Legenda de foto: Sarah Elmira Royster, que prometeu casamento a Poe em 1826, e mais tarde em 1849, quando ambos já viúvos. - fim da nota. 22  liz "desenvolvimento" do seu caso amoroso. O Sr. e a Sra. Royster tornaram-se evidentemente conhecedores do fato de que o jove Poe não era mais considerado herdeiro por seu pai de criação.

Logo souberam, sem dúvida, de seu namoro com Elmira, e então trataram de fazer pressão para desfazer o noivado. As cartas de Poe para sua amada foram interceptadas; proibiram que Elmira lhe escrevesse; as atenções de um jovem solteiro aceitável, A. Barrett Shelton a cercaram, insistentes; e por fim mandaram-na para fora, por algum tempo, sob custódia. Entrementes, o Sr. Allan foi informado das dificuldades financeiras de seu pupilo, cujas dívidas, dizia-se, haviam atingido o montante de 2500 dólares. Sua cólera tornou-extrema, e quando Poe voltou a Richmond, para passar as férias do Natal de 1826, foi avisado por seu tutor que não poderia voltar para a Universidade. As primeiras semanas de 1827 foram passadas em Richmon nas mais tensas relações entre o jovem Poe e o Sr. Allan.

A carreira de Poe na Universidade fora, sem dúvida, bastante insatisfatória. Por outro lado, a cólera do Sr. Allan era implacável e extrema. Recusou-se a pagar qualquer das dívidas de honra de seu pupilo ou quaisquer outras dívidas; por esse meio reduzindo ao desespero o espírito altivo do rapaz, que ele tinha elevado à categoria de seu filho. O jovem Poe estava perseguido pelas letras de câmbio.

Seu pai de criação aproveitou a oportunidade para insistir em que ele estudasse Direito e abandonasse todas as ambições literárias. Aparentemente por causa disso deu-se, afinal, o rompimento. Tíveram eles violenta discussão, em março de 1827, ao fim da qual o jovem poeta deixou a casa e foi para uma hospedaria, donde escreveu pedindo sua mala e suas roupas e objetos pessoais. Muitas cartas foram trocadas entre os dois sem que se chegasse a uma reconciliação. Seus mútuos agravos se repetiram e Poe, afinal, acabou por, a despeito de seu extremo desamparo, seguir para Boston então a capital literária dos Estados Unidos.

Parece que o Sr. AlIan tentou evitá-lo, mas sua mulher e sua cunhada talvez tenham suprido Poe secretamente de uma pequena soma de dinheiro, por intermédio de um dos escravos, antes que o rapaz se pusesse a caminho. Sob o nome falso de Henri Le Rennet, abandonou Richmond com um companheiro, Ebenezer Burling, e alcançou Norfolk (Virgínia). Ali Burling o deixou, enquanto Poe continuava a viagem num navio até Boston, onde chegou quase sem dinheiro, em certo dia de abril de 1827. Não foi para o estrangeiro, como tem sido tantas vezes afirmado, até por ele mesmo.

As datas de seus conhecidos paradeiros, tomadas de suas cartas e documentos naquela ocasião, afastam definitivamente mesmo a possibilidade de uma viagem à Europa. Em Boston há provas um tanto obscuras de que Poe tentou manter-se escrevendo - para um jornal. E certo, porém, que, e quanto se achava em Boston, durante a primavera e o verão 1827, travou amizade com um jovem impressor, um tal Calvino 23 F. S. Thomas, entrado de pouco no negócio, e valeu-se dele para imprimir um volume de versos, Tamerlão e Outros Poemas. Parece que o impressor não conheceu Poe senão por um falso nome. A capa do pequeno volume afirmava que o trabalho era de "Um Bostoniano".

A maior parte da edição, provavelmente devido à incapacidade de Poe para pagar ao impressor, foi ao que parece des- truída, ou teve que ficar encalhada. Somente poucos exemplares do livro entraram em circulação e apenas apareceeram duas apagadas noticias. O próprio Poe parece ter reservado muito poucos livros para seu uso pessoal. Entrementes, o autor desse volumezinho desconhecido, mas agora famoso, achava-se reduzido à maior pobreza.

Totalmente sem meios, demasiado orgulhoso ou incapaz de recorrer a Richmond, tomou por fim a desesperada resolução de alistar-se no Exército dos Estados Unidos, em 26 de maio de 1827, sob o falso nome de Edgar A. Perry. Foi destacado para a Bateria H do 1O. de Artilharia dos Estados Unidos, e passou o verão de 1827 no acampamento do Forte Independência, no porto de Boston. No fim de outubro, seu regimento teve ordem de seguir para o Forte Moultrie, em Charleston (Carolina do Sul).

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